Poema Flor-noite

Flor-noite


Flor,
névoa de ser
viragem elementar
da inexorável aura
que a noite ouve.

Noite,
memórias e saudade
das vertigens parabólicas
entre a empatia dos recantos
e a transgressão estapafúrdia.

Flor-noite,
poética sabedoria.


Composição de Filipe de Fiúza,
palavras gentilmente escolhidas por cada um dos participantes
no encontro Poetas Aqui Connosco de Julho 2012.




VERSÃO MANUSCRITA


Foto-instantes Encontro Julho 2012





































Donis de Frol Guilhade: poeta meta-cósmico



Fotografias e edição por Mariis Capela

William Blake, António Botto, Raul Leal, Judith Teixeira e Donis de Frol Guilhade

No dia 21 de Julho de 2012 realizou-se mais um encontro de Poetas Aqui. Connosco, desta vez com a participação especial do escritor e biografo António Augusto Sales. Filipe de Fiúza apresentou a todos os presentes no Ateliê CriArt um pouco da vida e obra do poeta inglês William Blake e dos poetas portugueses António Botto, Raul Leal e Judith Teixeira. O poeta Donis de Frol Guilhade foi o convidado do Poetas Aqui. Connosco de Julho 2012.


WILLIAM BLAKE - Poeta Estrangeiro





Leituras das obras O Primeiro Livro de Urizen, A União do Céu e do Inferno e Canções de Inocência e de Experiência:



Excerto:

«Chap: V

2. Enfurecido sufocado de sofrer,
Para norte lançou o seu Braço direito
E para Sul lançou seu Braço sinistro,
Estendidos em profunda angústia,
E o Abismo inferior for calcado a seus pés
Em tremor, regido e agonia.
E assim volveu este sétima Idade.
E este tempo de horrível sofrimento.»




Excerto:

«Os Poetas antigos animaram todos os objectos sensíveis com Deuses ou Génios, designando-os pelos nomes e ornando-os com os atributos de florestas, rios, montanhas, lagos, cidades, nações e tudo quanto os seus sentidos dilatados e numerosos podiam perceber.
Estudaram em particular a índole de cada cidade e país, subordinando-a à sua divindade mental;
Até que se formou um sistema de que alguns se aproveitaram para escravizarem o vulgo, pretendendo tornar reais as divindades mentais ou abstraí-las dos seus objectos: foi assim que apareceram os padres.
Retirando formas de culto de lendas poéticas.
E por fim proclamaram que tudo isso tinha sido determinado pelos Deuses.
Assim, os homens esqueceram-se de que Todas as divindades residem no coração humano.»




ANTÓNIO BOTTO - Poeta Português Conhecido





Evocou-se a personalidade e a obra do grande poeta António Botto, amigo pessoal de Fernando Pessoa, com a participação especial do escritor António Augusto Sales autor da mais completa biografia sobre o poeta intitulada António Botto - Real e Imaginário.

Foram lidos vários poemas do polémico livro Canções, entre os quais:

Quem é que abraça o meu corpo
Na penumbra do meu leito?
Quem é que beija o meu rosto,
Quem é que morde o meu peito?
Quem é que fala da morte
Docemente ao meu ouvido?
- És tu, senhor dos meus olhos,
E sempre no meu sentido.

____


Anda, Vem

Anda, vem... por que te négas,
Carne morêna, toda perfume?
Por que te cálas,
Por que esmoreces
Boca vermêlha, - rosa de lume!

Se a luz do dia
Te cóbre de pêjo,
Esperemos a noite presos n'um beijo.

Dá-me o infinito goso
De contigo adormecer,
Devagarinho, sentindo
O arôma e o calôr
Da tua carne, - meu amôr!

E ouve, mancebo aládo,
Não entristeças, não penses,
- Sê contente,
Porque nem todo o prazer
Tem peccado...

Anda, vem... dá-me o teu corpo
Em troca dos meus desejos;

Tenho Saudades da vida!

Tenho sêde dos teus beijos!

____

Andáva a lua nos céus

Andáva a lua nos céus
Com o seu bando de estrellas.

Na minha alcova,
Ardiam vellas,
Em candelabros de bronze.

Pelo chão, em desalinho,
Os velludos pareciam
Ondas de sangue e ondas de vinho.

Elle olhava-me scismado;
E eu,
Placidamente, fumava,
Vendo a lua branca e núa
Que pelos céus caminhava.

Aproximou-se; e em delirio
Procurou ávidamente,
E ávidamente beijou
A minha boca de cravo
Que a beijar se recusou.

Arrastou-me para Elle,
E, encostado ao meu hombro,
Fallou-me d'um pagem loiro
Que morrêra de Saudade,
Á beira-mar, a cantar...

Olhei o céu!
Agora, a lua, fugia,
Entre nuvens que tornavam
A linda noite sombría.

Déram-se as bocas n'um beijo,
- Um beijo nervoso e lento...
O homem cede ao desejo
Como a nuvem cede ao vento.

Vinha longe a madrugada.

Por fim,
Largando esse corpo
Que adormecêra cansado
E que eu beijára loucamente
Sem sentir,
Bebia vinho, perdidamente,
Bebia vinho... até cahir.

____

Quem não Ama não Vive

Já na minha alma se apagam
As alegrias que eu tive;
Só quem ama tem tristezas,
Mas quem não ama não vive.

Andam pétalas e fôlhas
Bailando no ár sombrío;
E as lágrimas, dos meus olhos,
Vão correndo ao desafio.

Em tudo vejo Saudades!
A terra parece mórta.
- Ó vento que tudo lévas,
Não venhas á minha pórta!

E as minhas rosas vermelhas,
As rosas, no meu jardim,
Parecem, assim cahidas,
Restos de um grande festim!

Meu coração desgraçado,
Bebe ainda mais licôr!
- Que importa morrer amando,
Que importa morrer d'amôr!

E vem ouvir bem-amado
Senhor que eu nunca mais vi:
- Morro mas levo commigo
Alguma cousa de ti.




RAUL LEAL e JUDITH TEIXEIRA- Poetas Portugueses esquecidos






Raul Leal, juntamente com António Botto e Judith Teixeira, foram três poetas considerados malditos e de sodoma no início do século XX em que respectivamente foram apreendidas e queimadas as suas obras Sodoma Divinizada, Canções e Decadência.

Filipe de Fiúza apresentou no encontro poético uma nova edição do livro Sodoma Divinizada excelentemente bem organizada editada pela Guimarães Editores e a FNAC da autoria de Aníbal Fernandes.



Toda a obra poética de Raul Leal é um caso único da literatura portuguesa pois foi escrita integralmente em língua francesa.








Da poeta Judith Teixeira leram-se vários poemas da obra Decadência entre os quais:


Rosas Vermelhas

Que estranha fantasia!
Comprei rosas encarnadas
às molhadas
dum vermelho estridente,
tão rubras como a febre que eu trazia...
- E vim deitá-las contente
na minha cama vazia!


Toda a noite me piquei
nos seus agudos espinhos!
E toda a noite as beijei
em desalinhos...


A janela toda aberta
meu quarto encheu de luar...
- Na roupa branca de linho,
as rosas,
são corações a sangrar...


Morrem as rosas desfolhadas...
Matei-as!
Apertadas
às mãos-cheias!


Alvorada!
Alvorada!
Veio despertar-me!
Vem acordar-me!


Eu vou morrer...
E não consigo desprender
dos meus desejos,
as rosas encarnadas,
que morrem esfarrapadas,
na fúria dos meus beijos!


Delírios Rubros

Quebro as nervos teu torturas
como contas ressequidas,
crispados por amarguras
nas minhas noites perdidas!

Ando na vida às escuras...
Se estendo as mãos doloridas,
abrasam-me mordeduras
de bocas encandescidas!

Sempre a fúria dos desejos,
a gritar pelos teus beijos
incendiando o meu sangue...

Traz-me o vento em seus clamores
presságios de novas dores —
e eu fico desfeita, exangue!


Liberta

Noutros cenários a minha alma vive!
Outros caminhos..
Por outras luzes iluminada!
- Eu vim daquele mundo onde estive
tanto tempo emparedada…

Andavam de negro
As minhas horas…
A esquecer-me da vida-
Não me encontrava!
Meus sonhos amortalhados
Em crepúsculo,
A noite não os levava!

.............................

Um entardecer triste e doloroso
Enrubesceu o céu!
E o meu olhar ansioso
Fundiu-se no teu !

.............................

E as tuas lindas mãos,
Esguias e nevróticas,
Pintam-me telas rubras
Bizarras e exóticas
De largos horizontes…

.............................

Hoje, ergue-me a ânsia enorme
De outras horas viver!
- Sensualizando a vida,
Descobrindo novas fontes
De dor e de prazer…

- Orgias de estranha cor
de que tu fosses somente
o extraordinário inventor!

Pôde-se ouvir também poemas lidos por Luís Gaspar - www.estudioraposa.com - como é o caso do poema Volúpia:







DONIS DE FROL GUILHADE - Poeta Português convidado






Textos auto-biográficos gentilmente enviados pelo autor:

«Luíz PIRES DOS REYS está convencido que é por uma (in)felicidade do acaso, ou por uma felicíssima coincidência, que existe rosto e rasto que de si persistam. Mais provável é não havê-los.Mas já que os há, apresenta-se ele de cabeça descoberta, olhar desencoberto e de braços não caídos em si. Para não se apresentar desmazelado, apresenta-se sem mazelas

Diz que estudou philo-sophia, até onde a suportou universitária, porque mais a encontrou – diz, insistente e i-reverente – fora da escola e de certo escol, acabou (um tanto distraidamente diga-se) alhures, urdindo apofasias, teologuismos e teologomenas de mais orientais (presume-se que mais orientadas) orto-doxias, o que serve igualmente para nada, como é mais do que demasiado evidente – mas, ainda assim, parece, não faz mal à saúde. Ainda bem. Mais vale a pena coisas inofensivas que se faz sem saber (porque, alfim, nada se sabe), do que ingenuamente fazer coisas que não valem nem a pena – ainda que se pense imaginar sabê-las

Após (esquecido quase de Si) esquecíveis anos por outras laboriosas paragens onde logrou dirigir, com marketing etudo, um indigesto departamento numa multinacional de sujar papel para lixo publicitário, vê-se metido no embrulho deste assado de dar desígnio e design a uma exdrúxula revista com o nome agudamente grave de “Cultura Entre Culturas”. Bem feito! Para inteiro (des)tempero do caso, vai daí, o temerato director intima-o, incorrigível e plácido (como se ele se tratasse de um ser senciente de/da verdade), a aceitar conferir marca de alguma arte a cada página da dita. Que desdita, valha-nos Deus (que sabemos que não existe, mas Há)!

Querem fazê-lo acreditar que seja Donis de Frol Guilhade. Mas ele – que mais acredita no que se não pode sequer acreditar – mais crê que tal seja verdade por ser tão quase impossível. Vozes do sem-tempo dizem-no outrossim sacer-dotado, mas sabe ele que isso é coisa de que não há antes e depois de sê-lo: é-se de sempre, para nunca – o que assim o retira de tal suspeita, posto saber ele sê-lo de nunca, para sempre nunca chegar a sê-loe ao deixar de ser: para ser.»

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Donis de FROL GUILHADE não existe.
Ainda não nascera, e já não era: alguém não é, que alguém conheça.
Ele, ninguém – o coisa nenhuma que algo seja no que se chame ele – nada anuncia e despede-se de tudo: por um tudo nada. De um nada de que ninguém sabe tudo, nem nada.Ninguém verá, e a ninguém verá, quem de si não viu o que ninguém lhe veja.
Há um ausir como de aceno de que n’alguém, que pode ter sido ou não, esteja em alguma qualquer parte, apenas porque assim é o que não é: sem já nem ainda – quando muito, nunca.
O quedele se leia, há-de tresler-se-lhe: para que, quando se nos lesse, tal qual se não leia.

Quando pareça aparecer, tão-só se lhe vê uma brisa – que lhe afaga e esbofeteia quanto incontém – deixada antes de haver passado, e de passado haver fé assim.
Não publica: força-se ao avesso – é disso que há rasto, onde haja havido anverso e um verso disso. É sempre des-terro do que não tem terra natal, nem afinal final.
O futuro persegue-lhe a saudade, o passado há-de ser-lhe. O presente parece não ser-lhe, nem outra coisa qualquer.
Quando nem se der alguém conta – que ninguém dará - será ido: que não veio. Sem agora que o haja ou que o valha. Para nunca: desde sempre.
Qual nunca foi, jamais não será.Qual nunca veio, sempre nunca virá. Qual rocha, de vento e mar: por defeito e, outrossim, de feito.
Qual de-functo: de Frol será. Guilhade, guilha de: d’Onix, Donis.
O mais – que é (o) menos, se o haja – silêncio é. E mais não há d’O que seja.
(H)ei-l’O: ali, ond’Eli, Uax’Allah. Om Iaô.
Donis é tão-só nome de cego.De tanto (não) ver.
E pede se lhe perdoe tão mudo falar.

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Fascinante, surpreendente e meta-cósmico poeta do qual foram lidos vários poemas inéditos de algumas obras escritas há mais de 30 anos.

luar sobre o monte cynthia

Ia a Lua, oclusa em seu esplendor argênteo,
quando o luar-te ela te abriu como doce corola,
humana planta nocturna, lótus que em ti
álacre latejasse, em pleno ser, em perene flor.

A Deusa, Mater benigna, viera beijar-te
rasgando o véu do céu que te encobria
de ti mesma e da terra que te fez, qual mãe celeste
dormente no orbe em que oferente te oferecias.

Candelário,o rito, acesa te apresentou,
virgem oferente, pura e pronta, em cálice de néctares
na floração nocturna do astro de todo o estro maior.

Vieste de luz aparelhada, invisível como um véu,
coroada de brandos luares e de êxtases vestida:
o sacerdote, que a si ofereceu, te ofereceu toda.

(inédito)

Donis de Frol Guilhade



O grande momento da noite foi quando o próprio autor lê integralmente, com o entusiasmo e a luminosidade profética que só os verdadeiros poetas detém, a sua obra poético-apocalípca Diadema da qual apresentamos o seguinte excerto inédito:



da obra: pratica as primeiras

envolto em adamante, vigoroso íris
o rosto tinha como fogo
o sol aberto na planta da mão.

eis brama alguém astroso sobre o mar
e - quando já sete os trovões –
qual arúspice dispõe o sigilo

(não haverá mais de mora
nos dias em que vier,
de finitiva, a loa nova).

toma e devora-se na boca
as entranhas funestas, como mel:
depois do vómito profetizará.

(inédito)

Donis de Frol Guilhade